Como funciona a saída temporária
De acordo com o artigo 122 da Lei de Execução Penal (Lei 7.210, de 1984), a saída temporária pode ser concedida a condenados que cumprem pena em regime semiaberto. Eles podem sair, sem vigilância direta, para três finalidades:- visita à família;
- frequência a curso supletivo profissionalizante, bem como de instrução do 2º grau ou superior;
- participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social.
- Ainda segundo a legislação, para ter direito ao benefício, o preso precisa ter cumprido no mínimo 1/6 (um sexto) da pena, se for primário, e 1/4 (um quarto), se for reincidente, e apresentar “comportamento adequado”.
O condenado que cumpre pena por praticar “crime hediondo com resultado morte” não tem direito à saída.
Regras atuais da "saidinha"
Antes de sair, o preso deve fornecer às autoridades o endereço onde poderá ser encontrado – normalmente, a casa de algum familiar. Ele precisará se manter na residência informada durante os períodos noturnos e estará proibido de frequentar bares, casas noturnas e “estabelecimentos congêneres”.
A saída temporária pode ser concedida até cinco vezes no ano e dura, no máximo, sete dias corridos.O que muda com o projeto
O PL 2.253/2022 revoga o artigo citado acima e determina novas regras para a saída temporária. Inicialmente, o texto acabaria com o benefício. Relator, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), no entanto, acatou uma emenda feita pelo senador Sergio Moro (União-PR) que mantém o benefício a presos inscritos em cursos profissionalizantes ou nos ensinos médio e superior.
Outros tópicos da proposta
O PL 2.253/2022 trata também de outros temas. Um deles é a realização de exame criminológico para a progressão de regime de condenados. De acordo com o texto, um apenado só terá direito ao benefício se “ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento, e pelos resultados do exame criminológico”. O teste deve avaliar, por exemplo, se o preso é capaz se ajustar ao novo regime “com autodisciplina, baixa periculosidade e senso de responsabilidade”.
O projeto ainda estabelece regras para a monitoração de presos, propondo que o juiz determine a fiscalização eletrônica para:
- aplicar pena privativa de liberdade a ser cumprida nos regimes aberto ou semiaberto ou conceder progressão para tais regimes;
- aplicar pena restritiva de direitos que estabeleça limitação de frequência a lugares específicos;
- conceder o livramento condicional.
Morte de sargento em MG
O debate sobre a saída temporária voltou a ganhar força após a morte do sargento Roger Dias da Cunha, da Polícia Militar de Minas Gerais. Ele foi baleado na cabeça no dia 5 de janeiro, após uma abordagem a dois suspeitos pelo furto de um veículo em Belo Horizonte. O autor dos disparos era um beneficiado pela “saidinha” que deveria ter voltado à penitenciária em 23 de dezembro e era considerado foragido da Justiça.
Números da saída temporária
De acordo com dados da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen), do Ministério da Justiça, de janeiro a junho de 2023, 120.244 presos tiveram acesso à saída temporária em todo o país. Desses, 7.630 não retornaram, se atrasaram na volta à unidade prisional ou cometeram uma falta no período da saída, o que representa uma parcela de 6,3% do total de beneficiados.
Segundo levantamento do G1, 52 mil presos foram liberados para a mais recente “saidinha” de Natal, sendo que 49 mil retornaram (ou 95%). Outros 2,6 mil (ou 5%) não voltaram e são considerados foragidos.
Entre eles estão, inclusive, chefes de facções criminosas do Rio de Janeiro, como Saulo Cristiano Oliveira Dias, o SL, e Paulo Sérgio Gomes da Silva, o Bin Laden.
MPF defende “saidinha”
Após a aprovação do projeto de lei na comissão do Senado, o Ministério Público Federal (MPF) emitiu um comunicado, de autoria do Grupo de Trabalho de Defesa da Cidadania, manifestando-se contrário à proposta, que seria “flagrantemente inconstitucional”.
O grupo destaca que o juiz segue uma série de regras específicas para a concessão das saídas temporárias “a partir de minuciosa avaliação de cada caso” e ressalta que pessoas condenadas por crimes hediondos que resultaram em morte, por exemplo, não recebem o benefício, que é automaticamente revogado quando o preso beneficiado pratica algum fato doloso, é punido com falta grave ou não atende às condições impostas pela legislação.
“As chamadas saidinhas são importante instrumento de ressocialização e reconstrução dos laços sociais, fortalecendo os vínculos familiares e contribuindo para o processo de reintegração social da pessoa em privação de liberdade”, diz o comunicado.
"Os discursos populistas que associam as ‘saidinhas’ ao aumento da criminalidade violenta carecem de embasamento em dados da realidade e ignoram sua relevância para o sistema de progressão de regime necessário à reintegração social das pessoas em privação de liberdade, o que segundo a lei é a principal função da pena de prisão
“Assim, em vez de buscar retrocessos, entendemos que o debate e as iniciativas em torno do sistema prisional seriam mais proveitosos se pautados pelos reais problemas que enfrentamos em todo o país, onde as prisões se encontram em um “estado de coisas inconstitucional” como já apontou o Superior Tribunal Federal (STF)”, finaliza a nota.