O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) garantiu a um advogado o direito de realizar a gravação audiovisual de sua própria manifestação durante uma sessão do Tribunal do Júri.
A decisão da 2ª Câmara de Direito Criminal cassou uma determinação de primeira instância que havia proibido o ato e estabeleceu que a medida é um instrumento essencial para o exercício da advocacia e para a garantia da ampla defesa.
O que aconteceu
O caso teve início quando um advogado, atuando na defesa de um réu pronunciado por cinco tentativas de homicídio, solicitou ao juízo da 1ª Vara do Júri da Capital a autorização para gravar, por meios próprios, exclusivamente a sua sustentação oral durante o julgamento. O pedido especificava o compromisso de resguardar a imagem e a privacidade dos jurados e demais participantes da sessão.
- Contudo, o juiz de primeira instância indeferiu o pedido. A fundamentação se baseou na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), argumentando que a gravação da imagem e da voz dos presentes configuraria tratamento.
- O magistrado destacou os riscos relacionados à segurança da informação, como o armazenamento em dispositivos particulares vulneráveis e a possibilidade de uso indevido do material, citando inclusive a criação de “deepfakes”.
- Para o magistrado, “a participação em ato público, por si só, não se traduz em hipótese legal que legitime a coleta e o armazenamento indiscriminado de dados pessoais (voz e imagem) e muito menos a posterior divulgação em rede social”.
- Inconformado, o advogado impetrou um mandado de segurança no TJSP, alegando que a proibição violava seu direito líquido e certo de exercer a profissão. A defesa argumentou que a gravação é permitida pelo Código de Processo Civil (CPC), aplicável de forma subsidiária ao processo penal, e que a própria LGPD excepciona o tratamento de dados para o exercício regular de direitos em processos judiciais.
O que o tribunal decidiu
Ao analisar o mandado de segurança, a 2ª Câmara de Direito Criminal do TJSP acolheu os argumentos da defesa e concedeu a segurança, autorizando a gravação. O relator, desembargador André Carvalho e Silva de Almeida, embora reconhecendo a pertinência das preocupações do juiz, concluiu que a legislação processual se sobrepõe à proibição.
- O desembargador invocou o artigo 367, parágrafos 5º e 6º, do Código de Processo Civil, que assegura às partes o direito de gravar integralmente a audiência em imagem e áudio, “independentemente de autorização judicial”. O acórdão reforçou que, na ausência de norma específica no Código de Processo Penal, a regra do CPC é plenamente aplicável, conforme o artigo 3º do CPP e a jurisprudência consolidada.
- Para a Câmara, embora a transmissão ao vivo das sessões exija uma reflexão mais aprofundada, “a gravação unilateral não pode ser proibida”. No acórdão, os desembargadores pontuaram que a captura em áudio e vídeo da atuação defensiva “constitui um instrumento essencial para o livre exercício profissional, além de assegurar os princípios do devido processo legal, da publicidade, do contraditório e da plenitude de defesa”.