domingo, 17 de abril de 2022

Império do Bacamarte: o coronelismo no Cariri cearense


Liduíno Lopes de Brito
 
A História do Brasil passa pela História do Ceará e a História do Ceará passa inexoravelmente pela História do Cariri. Quem desconhece a Revolução de 1817 e a Confederação do Equador de 1824 desconhece o protagonismo dos filhos do Cariri, não conhece a historiografia cearense e, consequentemente, a brasileira.

Conforme acentua o insigne escritor Joaryvar Macedo, em seu livro “Império do bacamarte – uma abordagem sobre o coronelismo no Cariri cearense”, que recebeu edição primorosa em 2022, “no território cearense, as lutas e revoluções libertárias e independentistas de 1817 a 1824 partiram do extremo sul. Uma efêmera república deveu-se aos Alencares, tendo à frente a figura de dona Bárbara Pereira de Alencar.” E como a concordar com a nossa assertiva, arremata brilhantemente: “O Cariri, berço da liberdade em terras cearenses, influiu, decisivamente, nos destinos não apenas do Ceará. Dali partiu o bravo José Pereira Filgueiras, rumo à Capital, solidificando-se nossa independência. Posteriormente, a marcha guerreira e os feitos heroicos de sua expedição conquistaram a emancipação do Maranhão e a consolidação da independência no Piauí”.

Decorridos 30 anos da primeira edição (fora lançado originalmente pela Universidade Federal do Ceará em 1990 e reeditado em 1992 e 1998), “Império do Bacamarte” retorna para a glória de historiadores, pesquisadores, cientistas e interessados nessa temática sociológica, considerado como o mais completo ensaio do gênero até hoje escrito no Nordeste brasileiro.

Assim como “Capítulos da História Colonial” de Capistrano de Abreu (1853/1927) lhe confirma a superioridade como historiador, “Império do Bacamarte”,de Joaquim Lobo de Macedo (1937/1991), o mestre Joaryvar Macedo (como gostava de ser chamado),desponta como a obra-prima da historiografia cearense pelo seu poder de síntese.

José Murilo de Carvalho, no prefácio à sétima edição do livro “Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil” (1948), de Victor NunesLeal, afirma que a maior preocupação desse autor, ao publicar “O coronelismo e o coronelismo de cada um” na revista do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (Iuperj), era fazer-se compreendido em seu conceito de coronelismo. “De fato, a maioria dos autores que empregaram o conceito usado por ele, sem distinção entre críticos e admiradores, identificava coronelismo commandonismo local. Era o caso do crítico Eul-Soo Pang e do admirador Barbosa Lima Sobrinho, que por insistência do autor escreveu o prefácio à segunda edição do livro feita pela Alpha Omega, em 1975.”

Para Victor Nunes o conceito de coronelismo incorporava, sim, traços de mandonismo local, mas era mais que isso: fazia parte de um sistema, de uma trama que ligava coronéis (mandões), governadores e presidentesda República. Para ele (Victor Nunes), o coronel entrouem sua análise por ser parte desse sistema, dessa estrutura e de suas relações de poder desenvolvidas na Primeira República, a partir do município.

A partir da publicação de “Império do bacamarte”(1990), esse conceito torna-se cristalino. Segundo JoaryvarMacedo, “no Cariri, a autocracia, base da autoridade sociopolítica dos coronéis, atingiu todas as esferas de poder. Agiam eles quais árbitros supremos sobre tudo e sobre todos. Indicavam nomes ao governo para o preenchimento dos cargos e exigiam demissão de juiz, promotor e delegado, sendo prontamente atendidos”. Por sua abordagem, pela análise sistêmica empreendida sobre o coronelismo no centro sul do Ceará, Joaryvar Macedo é de fato o “maior escritor de todos que voltaram suas vistas para o passado de nossa terra comum...”
Salve, Joaryvar, em seus 30 anos de passagem para o outro plano de vida, mesmos 30 anos da publicação da primeira edição dessa obra definitiva.
 
LIDUÍNO LOPES DE BRITO – Diretor Geral da Fundação Sintaf 
liduíno@fundacaosintaf.org.br